Gargalhada de principio ao fim, vale apena ler...
Numa Vila em Trás dos
Montes, com o nome de Argozelo, uma terra de negócios e de grandes negociantes.
Aproximadamente de 95% dos
negociantes de Argozelo eram oriundos do Bairro de Baixo.
No Bairro de Cima mais
propriamente da praça para cima, eram maioritariamente grandes agricultores.
Falemos agora dos
comerciantes, os verdadeiros peleiros, enquanto criança foi com eles que eu
mais me relacionei e que ainda hoje os tenho na lembrança…
Quando o tempo estava
desagradável o que não permitia as fazer suas saídas era quando se juntavam e
tinham as suas conversas.
Já quando estava bom tempo,
ai já ninguém os parava! Corriam todo o Nordeste Transmontano de quintas a
aldeias de vilas a cidades corriam de porta em porta numa grande correria.
Estes peleiros negociavam
todo o tipo de peles como por exemplo de ovelha, cordeiro, vitela, raposa,
coelho e até lobos e cães, incluindo ferro velho, carniçoilo e lã etc.,.
Estes negociantes eram muito
destemidos, também compravam animais vivos pelo preço das peles para lhe
aproveitar mais alguma coisa, era o caso das vacas- as patas, os boços as
tripas para assim fazerem os seus fumeiros. As suas esposas já estavam à espera
que assim acontecesse e também se tornava numa grande alegria para toda a
família e vizinhança.
Nesta comunidade de
peleiros, haviam uns mais espertos do que outros, mais rápido chegava ao local
com um burro velho do que um esperto com um bom macho pois este era o meio de
transporte destes grandes comerciantes.
Todos começaram muito novos
alguns não sabiam ler nem escrever mas faziam contas como o melhor professor,
aprenderam só com uma lição chamava-se – A VIDA.
Normalmente começavam com um
burro velho a cair, depois iam comprando as suas bestas conforme corresse o
negócio. Alguns nem este burro velho conseguiam manter, outros chegaram a ter
cavalos. O animal era a maneira de mostrar como corria o negócio e a sua vida.
Estes homens faziam grandes
sacrifícios, uns grandes guerreiros da vida saiam de noite à chuva e ao frio
com gelo e neve, também com muita fome e pouca roupa.
Faziam
muitos quilómetros sem saber o que lhes esperava e muitas vezes sem destino.
Quando chegavam, uns traziam
risos, outros choros, conforme corriam os negócios. Quando corria bem, era o
maior cantava de alegria, quando corria mal já ninguém o via.
No regresso a casa, enquanto
os filhos e a mulher descarregava a carga, ele ia já à procura de comprador
para a sua carga, vestia umas calças e uma camisa mais ou menos lavada e já
perfumada com o cheiro da mesma que acabou de despir. Nos sapatos até não eram
muito esquisitos, podiam até ser os mesmos pingados de sangue mas não foi da
carne do almoço, foi do cão de acabou de esfolar na oliveira, que ainda lá
tinha a corda do último.
Logo ao chegar à praça, o
compadre perguntou-lhe:
(Compadre) - Tão viesteis de fora? … - Ou
tivestes a matar alguma vaca chouriceira?
(Peleiro1) - Não compadre! Estive a esfolar um
cão! - Vamos masé mudar de conversa, e
venha masé comigo até lá baixo… - Quereis comprar alguma coisa, que acabei de
chegar de fora?...
(Compadre) -Vós nunca me vendeis nada! Sois muito
careiro!!!.
..
(Peleiro1) -
Seu Car***** tu é que não me mandas o valor justo!!! - Queres as coisas dadas… - Vem comigo que
trouxe boa carga e matas lá o bicho!
Quando chegaram a casa, o
peleiro logo gritou à sua mulher:
(Peleiro1) -
Óh rapariga, trás lá água-ardente e dois figos que está aqui o compadre!..
(Esposa) - Os
figos acabaram e a água-ardente está mesmo no fim! - Tu trouxeste alguma coisa
de fora?.
.
(Peleiro1) - Está aí um saco com nozes!
(Compadre) - Se te fudes** tu e às nozes! - Umas têm bicho, outras estão podres!...
(Peleiro1) - Não me digueis ?.. Que aquele corno
me enganou?!.. - Já me deixei enganar!..
(Esposa) - Não vos atrapalheis aqui não falta
de comer! - Ainda tenho aqui um boche e uma chacina!
(Compadre) - Não há problema, já lá em minha casa
os cabrões dos ratos, atacam tudo, até o pão que está no caixão!
No entanto lá se comeu o que
havia…. Entretanto lá chegou um vizinho, também ele peleiro, cheirou-lhe a
negócio…
(Peleiro1) - Bem vamos masé a negócios!... -
Tenho 10 peles de ovelha, 4 cordeiros e 2 vitelas!
(Compadre) -
Estão secas? Ou verdes?
(Peleiro1) - Estão como as véis! - Quanto dás por
todas?
(Compadre) - Bem, já que matei o bicho, como
compadre… Dou-vos uma nota e meia!
(Peleiro1) - Uma nota e meia? … - Tendes de me
dar mais!... As peles são boas e bonitas e não têm buracos!...
(Compadre) - Realmente as peles estão bem
esfoladas…. - Dou-vos duas notas!
(Peleiro1) - Tendes de me dar duas e meia!
(Compadre) - Não vos dou nem mais um testão!
(Peleiro1) - Não vos la vendo! - E já me
fudesteis o mata-bicho!....
O compadre logo se foi embora
sem negócio. O tal vizinho que tinha aparecido quando comiam era o Barreira,
que logo se infiltrou…
(Barreira) - Então não fizesteis negócio?.
(Peleiro1) -
Não Barreira! - Ele quis foi matar o bicho bem matado… queria as peles dadas!….
(Barreira) - Mostra lá as peles!... - Elas não
são más… - Esta já tem aqui um buraco, e as peles de cordeiro já se estão a
pelar.. - Mas dou-te uma nota e meia!...
(Peleiro1) - Olha leva-as, são tuas!... - Eu não
tenho sorte no negócio! - Não bouto a mão a mais uma pele!...
(Barreira) - Mas tens que me arranjar umas nozes
para os rapazes, e aquela roda de charrua para fazerem um carro para irem à
canina!
(Peleiro1) - Leva também o burro e a mulher! Eles
são velhos mas fazem-me falta!
O Barreira logo carregou a
carga para cima da mota.
A sua esposa Aurora, logo
agarrou nas ovelhas para as pôr ao sol, as de cordeiro foram para salgar, as de
vaca carregou-as o filho mais velho para as levar para os plames, porque os
mais novos já andavam à canina para colocarem tudo nos poços. Já que o Barreira
tinha falado com o compadre “Bitoubo”.
O Barreira já as tinha
prometido à sua mulher que estas peles seriam para a sua casa embelezar. Mas
entretanto apareceu o “Suíças” que as duas peles de vaca lhe rendiam para pagar
a carga que tinha comprado. As peles de ovelha, foram vendidas ao “Manino” que
por ali passava uma vez por mês vindo este do Porto, também ele natural da vila
de Argozelo.
Quando chegava o “Espanhol”,
que era o “Sr. Benigno” já só apanhava as peles de coelho e pouco mais. No
entanto já tinha chegado mais um peleiro com o ferro velho e lã. O Ferro velho
já vinha com o destino de ser vendido ao “ Tio Limpa”, a lã fica à espera do
“Francisco da Campela” que por todos era bem conhecido e respeitado.
Estes
quatro últimos Homens que referi, já eram considerados os peleiros ricos pois
já possuíam outro meio de transporte. Mas quem tinham o puder e eram
considerados os reis dos peleiros eram o “Tio Bertaldo” e o “Sr. Fernando do
Guxinha”. Mas quem mais sofria eram os pequenos peleiros que eram os que menos
ganhavam.
Muitos deles faziam muitos
quilómetros e começaram a ficar por la, acabando por levar o resto da família
consigo e ficando a residir por todo o distrito, nas aldeias, vilas e cidades,
mas nunca abandonando as suas raízes e continuando as suas atividades de
Peleiros, passado assim a irem à sua vila de Argozelo nomeadamente ao dia 24 de
Agosto um dia muito especial, onde é celebrado o dia de S. Bartolomeu, pois era
o dia que todos se juntavam e conviviam onde o assunto principal era os seus
negócios, onde cada um tinha a sua história para contar todas as aventuras de
todo o ano que tinham passado, umas tristes, outras grandes alegrias também dos
maus e bons negócios que tinham feito e que estavam para realizar.
Mas aí já havia outros que
estavam com os ouvidos à alerta para saber onde estavam os negócios porque já
no dia seguinte era dia de albardar as bestas e voltar para mais uma aventura,
pois era nesta altura do ano que o negócio mais abundava e não havia tempo a
perder.
Estes negociantes além das
suas dificuldades faziam-se sempre acompanhar com algum dinheiro mas muitas das
vezes também faziam algumas trocas, como por exemplo; esfolar os animais em
troca de uma pele e trabalhavam na agricultura para ter onde pernoitar e também
assim se alimentarem.
Eram todos muito sérios, por
vezes ficavam em casa de pessoas que não conheciam, onde ganhavam alguma
confiança ao longo do tempo, onde alguns já eram como família.
Havia um ou outro que
abusava das pessoas, mas só assim acontecia quando o proprietário se esquecia
das chaves da adega.
Quando chegavam de fora, não
se sabia quem trazia mais fome… se era a besta ou o dono?
Esta rotina de vida de
Peleiro era o seu meio de sobrevivência do nosso Bairro que ali nos criamos, a
fome não era muita, mas a fartura também não era muita…
Como era um meio de vida
muito difícil, os filhos destes homens começaram a emigrar também com muitas
dificuldades e com muitas saudades desta rotina que ainda hoje reconhecem que
foram peleiros com muita honra.
Os
talhos eram para os ricos; as galinhas para os doentes.
Os rapazes as dores de
dentes eram constantes, porque eram provocadas por comer o pão duro e furado
pelos ratos, ainda assim de vez em quando comiam um bocado de toucinho ou uma
alheira, porque os ratos já não conseguiam roer o fio dos chouriços.
De agricultura percebiam
pouco, e o interesse também não era muito porque o cheiro às peles era mais
forte.
Queriam chegar a casa e ter
a sua refeição na mesa, mas largar o dinheiro para comprar coisas, não era com
eles…
A maioria de toda essa Boa
gente já partiu, não houve nenhum que levasse o burro ou as peles, mas quem
sabe um dia se voltam com uma boa carga, mas com tanta concorrência por lá, não
haverá de dar uma pele para cada um!
Narrador: Ana Glória Luís Ferreira
Peleiro 1 (vendedor das pele): Nádia Ferreira
Peleiro 2 (
Peleiro que não quis comprar as peles): Domingos António Luís Ferreira
Barreira: Domingos Carvalho Ferreira
Mulher do Peleiro 1 : Tânia
China
Vamos agora nomear
alguns desses nomes e nomeadas desses comerciantes valentões, que faziam
negócios só com alguns testões…
Barreira,
Barão,
Bufo
e Mandrião.
Chico da Campela,
Galino,
Maloio
e Toninho.
José Cepeda,
Meia Arroba,
Pêgé,
e Namora.
Milano,
Puté,
Peito de Cortiça
e Zé Néché.
Rolinha,
Paco,
Santiago
e Riscado.
Penhas,
Pocata,
Redodndo
e Patarata.
Guelfo,
Batita,
Mama
e Limpa.
Sara,
Preto da Africa,
Pedrés
e Canana.
Zé do Mano,
Estuarda,
Pai-Ruim
e Fará.
Alcino
da Camboia,
Matias,
Chaves
e Suiças.
Chourrik,
Tio Gaiato,
Chézourro
e Malato.
Toucinho,
Palhuca,
Zé- Maria
e Mucha.
Zé da Cnocha,
Pesado,
Sençano
e taralho.
Questára,
Pinetche,
Pantomina
e Manéche.
Larau,
Luís Cepeda,
Platera
e Gago do Chena.
França,
Matias,
Vinte e Nove
e Zé Valente.
Chico Reis,
Chorão,
Ciências
e Bolão.
Cavalico,
Danado,
Cantil
e Flávio.
Galino,
Batoco,
Saranco
e António Moco.
Ferando
do Guchinha,
Bertaldo,
Prim
e Zoio.
Galucho,
Lhalhão,
Xoila
e Calmeirão.
Escrito por
Domingos Carvalho
Ferreira
18/2/2014
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