terça-feira, 13 de fevereiro de 2024

NAS HORAS DE NOSTALGIA...


Ainda se lembram?

Crónica


Escrevo para os que gostam de ler; para as pessoas que debatem ideias, ainda que diferentes das minhas, mas, sem assumirem o posto de guardiãs da verdade ou do absolutismo de uma vertente – sobre qualquer assunto que envolva, sociedade, cultura ou política. Escrevo para as pessoas com alma, que querem permanecer lúcidas, mesmo que na paisagem haja falta de empatia. A minha aldeia não é o mundo, é uma ponte para ligar a História, colocar no mapa a opinião e o sacrifício do que significa.

No ano em que nasci, nasceram mais quarenta e cinco crianças nesta aldeia. Aos sete anos, todas fomos frequentar a escola pela primeira vez. Fizesse chuva ou sol escaldante íamos a pé, fosse do bairro do Latedo, do Bairro de Baixo, dependendo de onde vivia até à escola. A roupa e calçado que usávamos por vezes não se adequavam ao tempo. Lembro-me no inverno chegarmos à escola completamente encharcados. Nesta altura a escola tinha três salas para raparigas e rapazes (separados).

Desde essa altura… que a minha memória começou a fixar as coisas que via. Lembro-me que era uma manhã risonha, com orvalhada, mas com sol quentinho, o meu tio Porfirio, aparelhou um jumento que tinha, com uma tosca albarda, e pôs-me em cima do animal e resolveu levar-me com ele até à horta que ficava para os lados de São Roque. Foi a primeira vez que montei num animal. Uma verdadeira aventura para uma criança da minha idade.

Depois de sair do povoado, comecei a avistar a natureza. Do meu lado esquerdo, os olmos e as eiras dos Amados; do meu lado direito, o sol que há pouco tinha nascido, as vinhas, terras cultivadas e ao ouvir os diferentes cantos das aves, perguntava ao meu tio; que pássaros são estes que estão a cantar? e ele dizia-me… é o rouxinol, é o pintassilgo, etc., isto ao longo das terras de cultivo. Ao avançar para os pinhais, o canto das aves já era outro; o cuco o gaio etc... O caminho marcado pelos fundos rodados dos carros de bois; e gostei tanto daquele contacto com a natureza, que não sei porquê, as minhas retinas de criança, fixaram e gravaram para sempre na minha memória, aquele cenário, para o resto da minha vida. Talvez daí a razão do que vou contar, e eis o principal cenário que continua vivo na minha mente e o motivo por que escrevo esta crónica.

Lembram-se desta Fonte das Nogueiras?

À semelhança de outras aldeias do interior, a nossa também nesta época não tinha luz elétrica nem água canalizada. Todos os fins-de-semana havia um bailarico, vinham pessoas doutras aldeias e principalmente jovens, pois nesta aldeia havia muitas raparigas. Era um dos entretimentos, onde se divertiam novos e mais velhos, ao som da rádio, ou do realejo. Qualquer coisa servia para divertir este povo sempre muito danado para a paródia. Como não havia luz elétrica, estes bailaricos por vezes eram feitos à luz do luar. Os rapazes muito malandrecos, aproveitavam-se deste momento para dar um beijinho ao seu par e despiderem-se; até ao próximo domingo.

Hoje, ao olhar para trás, fico admirado por, numa aldeia haver tantas profissões no ativo diário…quanto a profissões, havia de tudo um pouco. A maioria das pessoas eram comerciantes, agricultores e era da agricultura que viviam. Mas havia profissões a dar com um pau, como, por exemplo: ferreiros, carpinteiros, padeiros, costureiras, alfaiates, tecedeiras, barbeiros, latueiros, peleiros, eletricistas e mineiros estes; de desgaste rápido, pressão e stresse; desgaste emocional e físico; e condições de trabalho exigentes, e bastante penosas.

Hoje… percorrendo o mesmo trajeto (paraíso) de à setenta e seis anos, o que fiz, o caminho hoje é rua, é diferente; desapareceram os vestígios dos animais de carga e os rodados dos carros de bois e deram lugar a casas, as aves… essas desapareceram; o seu cantar foi substituído pelo som da rádio e as terras que outrora estavam bem cultivadas dissolveram-se. O paraíso da minha infância, da memória a desabrochar para o mundo, como aquela manhã de Primavera…desapareceram… mas enquanto eu viver, ainda me lembro…Há coisas que nunca esquecem…e outras por serem das primeiras que o nosso cérebro guarda, quando começamos a tomar consciência do que existe à nossa beira, ficam-nos gravadas para sempre nessa calculadora maravilhosa a que chamamos memória e vão e vêm à nossa mente para o resto da nossa vida. Esta é uma delas. É algo impagável. É sinal que vivemos e que a nossa vida fez sentido, só pelas pequenas histórias e memórias que conseguimos juntar ao longo dos anos. Todos temos histórias longínquas – quer fictícias, quer reais – que ao longo dos anos foram povoando o nosso imaginário, que nos acompanharam pela vida fora e que foram tomando conta da nossa memória. Para os mais antigos, são histórias de outros tempos, contadas nos serões das aldeias, à lareira, ou transmitidas oralmente às gerações mais novas. Podem ser relatos autênticos ou recriados, lendas, testemunhos, contos, isto é, uma herança cultural coletiva que se vai adulterando com o passar do tempo ou

E desta Imagem lembram-se

que, se não for transmitida, está votada ao esquecimento. Podem ser, também, vivências pessoais de tempos idos, que habitam a nossa memória individual e que recordamos com saudade e ternura. Em comum, têm a oralidade, a singularidade, os afetos e a pertença a uma terra, a um lugar.

Sonho daqui uns anos, mais velho, me relembrar de tudo o que vivi e saber que vivi a minha melhor vida. Rir comigo e com os meus amigos de todas as aventuras, experiências e peripécias que cada um viveu. Vão ser bons momentos.

Ao acaso dos caprichos das já longínquas e desvanecidas memórias minhas, sou assaltado por imagens desses outros tempos; inesquecíveis, vejo-as e ouço-as como se fossem hoje e agora. Como eu gostaria de saber transmitir numa tela, estas imagens de infância que ainda guardo na minha mente.

Adoro memórias. Adoro lembrar-me de pequenos momentos que me fizeram sorrir no passado e momentos menos bons que me fizeram quem sou hoje no presente. Ambos são tão importantes, apesar de ser muito melhor relembrar os momentos felizes. Pois na minha memória ficou mais acentuada aquela imagem da saída da povoação e o contacto com o espaço aberto da natureza (hoje sei) era de Primavera.

Regressar a uma aldeia onde fomos felizes, em crianças, é como tentar coser uma manta de pequenos retalhos de memória. Vale tudo para recuperar histórias e sensações antigas. Um cheiro, uma porta familiar. Ou uma conversa informal, entre amigos.

Na minha mente de criança, penso hoje, se existe o paraíso, seria aquela paisagem, aquele envolvimento com a natureza, naquele ambiente rural, naquela idade do desabrochar para a vida…visto por uma criança, nem me dava conta. Achava tudo normal.


A minha Aldeia primeira,

É linda de lés a lés,

Com o Serro à cabeceira,

E o Rio Maças a seus pés.


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sábado, 3 de fevereiro de 2024

A JUSTIÇA QUE TEMOS!


Como um sopro de nada, assim me esvaio nesta vida curta, onde uns tudo têm, tudo podem, tudo pisam, e outros, coitados, nada temos, nada podemos, coitados.

Um país estilhaçado por corrupção humana, sim, cometida pelos Homens, não por deuses ou arquitetos.

Um país que trata mal quem tanto deu à nação é um país sem futuro a quem um dia irá faltar o pão.

Um país despovoado é sinónimo de um futuro desequilibrado.
Triste sina a nossa onde nem a justiça nos vale, pois essa, que nos poderia servir a esperança, está mais cega do que nunca.

Valha-nos o calor do nosso humilde lar, com lenha apanhada por estas mãos, por animais criados por esta gente, por uma paz que não deseja a guerra, por uma vida que teima em não chegar ao fim.

A situação em que o mundo se encontra, diante de incoerências de mandatários de países impregnados de ideias dominantes, poderá resultar na deflagração de uma grande guerra em nível global...


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