domingo, 3 de setembro de 2023

AS VINDIMAS DA MINHA ADOLECENCIA!


 

Há quantos anos? Há cinquena? Há sessenta? 

Experiências da infância e da adolescência costumam ficar marcadas na nossa memória. Naturalmente, há aquelas que até desejamos esquecer, mas a maior parte daquilo que vivemos nessas fases da vida têm significado especial. Brincadeiras de criança, namoricos da escola, presentes de Natal, almoços de domingo, festas de aniversário. São recordações indeléveis, que nos ajudam a escrever capítulos importantes da nossa história.

Já tinha começado a emigração, já havia tratores. O tempo do carro das vacas com a dorna em cima já tinha dado o lugar ao trator e aos bidons. 

As vindimas era um tempo de muita alegria, trabalhava-se de graça com comida abundante, enchia-se a barriga de cachos e bebia-se o mosto. De recordação tenho os bolos de bacalhau, enquanto comíamos o patrão, com uma bola de cêbo de porco, vedava a dorna que teimava em deixar escapar o sumo da uva.

 A vindimas são uma época do ano especial, que abrange todas as atividades que decorrem entre a apanha da uva e a produção do vinho. Estas ocorrem entre setembro e outubro, quando as uvas já estão maduras. Quando os pés das uvas estão murchos e as peles dos bagos começam a encolher, estas estão prontas a serem colhidas.


Recordo com saudade as vindimas da minha infância e da adolescência, a atividade intensa salpicada de alegria e de constante boa disposição.   Era um trabalho em que toda a família se envolvia, era um ato de amor e de união, o reencontro de amigos, um trabalho partilhado em sintonia e harmonia.  Um sorriso fácil, um abraço de conforto que matava a saudade, uma autêntica celebração! Contavam-se histórias, havia conversas de mal dizer, assim como se  cantavam modas da época  e se namoriscava com a rapariga ou rapaz do agrado de cada um.

Fizesse sol ou chuva, a apanha das uvas começava bem cedo para aproveitar todas as caraterísticas de cada cepa. As pessoas distribuíam-se pelos valados e  apanhavam os cachos de uvas à mão ou cortavam-nos com ajuda de um canivete ou de uma tesoura, processo, ainda, utilizado nas vindimas.

Depois de uma manhã inteira a vindimar, chegava o descanso merecido com um almoço nutritivo, sempre em ambiente de festa. Desses almoços tenho saudades do sabor da espanholada e aromas inconfundíveis das sardinhas assadas na fogueira feita com vides. Sabores e cheiros que nunca mais os vivenciei!

Todo este ambiente era um verdadeiro manjar para as atarefadas abelhas que procuravam o néctar nas doces e suculentas uvas ou nas saborosas sardinhas. Dessas não tenho saudades, visto que fui mais de que uma vez ferrado.

À noite, o trabalho e as celebrações continuavam, nos lagares de pedra, onde homens e rapazes, de calções ou calças arregaçadas, em roda, davam os braços e ao ritmo da  música da rádio, pisavam as uvas colhidas ao longo do dia. 

Primeiro era o  corte, em que os homens, com os braços nos ombros uns dos outros, esmagam as uvas, sem deixar nenhum centímetro quadrado por pisar.

Após a fase de fermentação que durava várias horas, mais de vinte e quatro, o lagar era novamente trabalhado. Era pisado para que a parte sólida, que se formava na superfície do lagar, se misturasse com a parte líquida e haver uma maior extração de cores, aromas e sabores.

Por fim com o grau alcoólico atingido, deixava-se, por algumas horas, o lagar descansar para que a parte sólida ficasse à superfície. Depois abria-se a torneira na base do lagar e o mosto era transferido para pipas ou tonéis de madeira.

No meu caso, as férias grandes eram acima de tudo a grande oportunidade de ler. Adorava histórias de príncipes e princesas, fadas e bruxas, em que o bem triunfava sobre o mal e o amor saía sempre vencedor. Gostava também das  histórias de animais personificados, quase sempre começadas por: “Há muito, muito tempo, na época em que os animais falavam…” Nessa altura era utente assíduo da Biblioteca Itinerante Calouste Gulbenkian, que nos visitava regularmente. Aos seus abalizados funcionários devo o gosto que ainda tenho pela leitura. Foram eles  que muito contribuíram para esta minha paixão pelos livros e pela escrita,. Recordo que simpaticamente me aconselhavam os  livros adequados à minha idade e me deixavam trazer mais dos que os permitidos.


As férias na praia só as tive na idade de adulto, quando fui para o Estoril. Não são as minhas preferidas! Mas adoro passear à beira mar, chapinhar na água, pontapear as ondas e saborear e cheirar a brisa marinha! Apraz-me observar o sol espraiar-se no mar e criar um resplandecente por do sol  em tons de laranja e amarelo! Gosto de apreciar a beleza do verde e do azul  do mar  e sonhar com as terras distantes e os lugares recheados de magia que são banhadas por aquelas águas imensas! Como gostaria de viajar na crista das ondas e ser transportado para essas aventuras fantásticas e encantatórias.

Como gostaria de regressar aos verões da minha adolescência, em que tudo era simples e muito feliz, mas eu não o sabia.

De todos os trabalhos do campo, a vindima era aquele que eu mais gostava, pelos momentos de alegria e emoção.

 

Blog Freixagosa


 


2 comentários:

  1. Fiquei encantada, que maneira de viver maravilhosa.
    Gosto imenso da vida do campo, apesar de saber que é dura.
    Felicidades

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  2. Eu tenho a sorte de poder acompanhar e participar em todo este processo, é um pouco duro, mas mesmo assim aconselho a experimentarem pelo menos uma vez, é uma experiência verdadeiramente enriquecedora. O Ilidio detalhou muito bem todo este processo
    Parabéns

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