domingo, 11 de outubro de 2020

UMA HISTÓRIA DE CONFLITOS DE MEMÓRIAS

Do Alto de S. Roque, ao vale mais profundo do Teixo, do xisto das entranhas, donde saiu o estanho e volfrâmio, ao granito esculpido das campas milenares, da água calma, presa nos Inverniços, ao som das cascatas que fluem livres em Cal Silvar, do denso carvalhal da Estercada à rara crista do Serro surge o trabalho ousado da engenharia popular, simples engenhos para dar resposta a problemas quotidianos e a grandes obras que moldam a paisagem.

Chega até nós uma enorme riqueza cultural que manteve um estilo de vida em comunhão com a Natureza, séculos de História onde imperou um modelo económico centrado na casa.
A casa está concebida, não apenas como o lugar onde se mora. Engloba nela, para além da vivenda, espaços complementares de trabalho: curral, lojas, adega, espaço para o carro, para a lenha, procurando a intimidade, criando um mundo interior para que o exterior seja visto apenas pelas janelas. O elemento de ligação com o exterior é o portão, o único acesso para pessoas e animais e a sua estrutura coberta de madeira dá abrigo ao carro e serve de armazém do arado e outras ferramentas permitindo a realização de muitas tarefas ao abrigo do sol e chuva.

É a altura do carro que transporta os produtos do campo, com os estadulhos, que determina a medida para a portada. Define ainda a localização do armazém de sementes e palha, mantidos em lugar elevado como é o caso do palheiro. Por vezes, alinhado com o portão, na parte superior, fica a porta de abastecimento do palheiro.
Os diferentes tipos de casas admitem múltiplas variantes, o recurso a paredes meeiras, por exemplo, é uma estratégia tendo em vista a economia de espaço e recursos, muito utilizado em espaços mais urbanizados, cujas fachadas se enfeitam com varandas no piso superior e janelas no piso inferior.
Em Argozelo ainda é possível encontrar habitações que correspondem à típica casa transmontana, mas há sobretudo muitos exemplares que trazem até aos nossos dias o testemunho das vivências dos nossos antepassados – casas que resistem ao abandono, que nos gritam memórias de gentes que habitaram nelas e que receiam cair no esquecimento.

Escrito por

Luiz Rodrigues




Sem comentários:

Enviar um comentário