As recordações
de infância, aparentemente, adormecidas eternamente, surgem-nos muitas vezes de
forma tão clara e saudosista, como que um convite a materializá-las para não
mais serem esquecidas. Foi este estado de espírito, que me levou a pegar na
caneta e escrever este texto recordando os mineiros da minha aldeia há anos
atrás.
As Minas de
Argoselo, guardam a história de uma aldeia que nasceu e cresceu com a
exploração de volfrâmio e estanho. Antes da exploração mineira, apanhava-se o
volfrâmio a céu aberto no alto da cabreira e no ribeiro que corria desde Vale
de Milhos, até ao Prado, e no final do
dia vendia-se aos farristas que eram contrabandistas.
“Nos anos 40 um
quilo de volfrâmio chegou a valer mil escudos (cinco euros) Muitos
enriqueceram, com o dinheiro do negócio do Volfrâmio. Conta-se que havia homens
que fumavam notas enroladas como demonstração da abundância deste. Um quilo de
volfrâmio é uma pedra muito pequena”, referiu José da Bota .
A exploração
mineira na região de Argoselo foi um fator condicionador socioeconómico durante
a época áurea da exploração do volfrâmio. Esta atividade levou a muitas pessoas
a empregar-se nas minas, que viviam da agricultura de subsistência, nutrindo a
esperança de algum dia conseguirem melhores condições de vida.
Veio gente de várias
regiões do país, que aqui fizeram vida. A empresa contratava mineiros,
serralheiros, fundidores, torneiros, eletricistas, carpinteiros. «Havia de
tudo!». A todos os trabalhadores de fora era oferecida casa, água, energia elétrica
e médico. Chegou a mobilizar 250 trabalhadores e deixou memórias de um trabalho
difícil a 170 metros de profundidade.
Na mina
trabalhava-se 24 horas por dia, divididas em três turnos de oito horas. Eram
cerca de uma centena os trabalhadores por turno. Os ordenados eram parcos.
«Vinte e três escudos por dia» para alimentar as famílias. Também trabalhavam
na horta, quando saíam da mina ou das oficinas. À noite esqueciam as misérias
na taberna, onde se bebia uns copitos «Viveu-se assim muitos anos», conta o “Luiz
do Janta”
Talvez seja de
interesse histórico falar numa personagem de seu nome Aníbal Farinha, que era o
principal capataz na mina que segundo os antigos daria para escrever um guião
para um filme com as peripécias deste carismático e polémico ao nível do far
west, desabafo de Manuel Batita.
Lembro mais
alguns mineiros da nossa terra, falecidos ou que ainda estão entre nós, gente
que também quis ser feliz, teve sonhos, anseios e ambições. A minha singela
homenagem. Pena que só hoje consiga carregar nos pedais da memória e puxar
alguns fios soltos de remotas e às vezes delidas lembranças. Então aí vai:
Minante,
Judas, Boeira, Mixa, Manulo,
Carrasco, Manuel Batita, Carrega, Perséguia, José da Bota, Carriço, Catralipio,
João Lasgueira, Lameiras, José
Vitobo, Daniel Caipira, Luis do Janta, Mudo da galha, Daniel Caipira,
Diamantino Capela, Mula, Vai na
Brasa, José Calado, Barrecas, João Carreche,
Moda, Augusta do Lalão, Vitoba e Bernarda do
Nelo.
Com o final da
exploração todo o complexo foi abandonado na sequência da queda dos preços do minério, foi tudo «desmantelado e
vendido ao desbarato». Naquilo que teve de positivo e
negativo, e no significado que representa referente ao legado e à herança do
sítio mineiro e industrial, traduz-se, hoje, acabado o ciclo. Uma nuvem negra abateu-se sobre a Aldeia.
A boca da
galeria de Leitarães, que é agora entrada. É uma entrada para um mundo
misterioso, de escuridão, que entra pelas entranhas da terra adentro,
esventradas outrora, à custa de explosivos e da força bruta dos homens. Força
suada e esforçada, consumidora da vida, onde os dias se transformavam em noite
e o breu da mina era mais escuro do que a escuridão da noite mais escura.
Todavia, as consequências económicas são as únicas que causam angústia e
receio. Hoje, restam ruínas. Da entrada da mina, das oficinas, dos poços de
água. Se as pedras ficaram, os homens partiram. Emigraram, palavra que se
ajusta como uma luva ao Portugal dos anos 60. Foram para França, Bélgica,
Holanda, Alemanha, Canadá. Outros ficaram por cá. Agora, a localidade é uma
vasta sombra do passado glorioso.
Sequelas nos
mineiros foram muitas, os que morreram intoxicados nas minas. E ainda hoje, a
população mineira sofre as consequências tardias do contacto, dia após dia, com
o tufo, os resíduos de pólvora que era utilizada para abrir galerias, e outros
produtos tóxicos.
As mesmas imagens de abandono, de desemprego, de poluição, de desastre
ambiental. Numa frase: a forma como não se deve fechar uma mina, após o fim das
atividades exploratórias.
Argoselo uma
região mineira conhecida pela exploração de volfrâmio, que durante anos foi um
dos motores económicos desta região, temos a oportunidade de visitar o que
resta de um antigo complexo de minas.
Para muitos, a
exploração mineira terá sempre um significado especial. Pelas ligações
familiares e de amigos.
O município
também criou um percurso pedestre, “A Rota do Volfrâmio”, que tem como objetivo
promover as minas e a história do volfrâmio neste território do concelho de Vimioso
e dar a conhecer este património que tanto marcou as gentes locais.
Com cerca de quatro
quilómetros, esta pequena rota tem como ponto de partida o Museu até à Ponte
dos Mineiros. O itinerário percorre ainda caminhos rurais,
paisagens deslumbrantes do Rio Sabor e permite também que os seus pedestres
contemplem o Planalto de São Bartolomeu
Ilídio Bartolomeu
Parabéns Sr. Ilídio, o Centro interpretativo, merece mesmo uma visita.
ResponderEliminarParabéns, Ilídio Bartolomeu, pelo excelente texto que nos traz à memória o que, ainda não há muito tempo, era a vida dos mineiros e da aldeia. Felizmente, a dos mineiros, que emigraram ou não, melhorou um pouco. Contudo, da vida da aldeia que, apesar de, há já alguns anos, ter a categoria de vila, é que não poderemos dizer o mesmo. Como a generalidade das mais localidades do concelho de Vimioso, do Nordeste Transmontano e, no fim de contas, do interior do País, nas últimos décadas, devido às políticas erradas seguidas pelo Poder Central se traduziram em falta de investimento e de desenvolvimento das terras do interior que conduziram à emigração, à migração, e ainda ao consequente envelhecimento e que, conjugado com controlo da natalidade, perdeu a maior parte da sua gente, sobretudo, os mais jovens. Espero que todos os naturais, residentes ou não, descendentes e amigos das localidades do concelho, contando com um Poder Local com uma visão, um sentido estratégico, mais atuante e com soluções mais adequados às reais necessidades do município de Vimioso e das 22 que o integram, estejamos ainda a tempo de poder inverter este ciclo que conduziu ao despovoamento e à morte lenta das localidades de cerca de 2/3 do País, mas, com mais grave incidência, o Nordeste Transmontano, sobremaneira, as Terras de Miranda e, ainda mais, o concelho de Vimioso.
ResponderEliminarAlerto, especialmente, os jovens, mas também os mais distraídos, de que, o valor nominal dos 1 000$00 dos anos 40 e seguintes do século passado corresponde atualmente a €5. Contudo, para encontrar o seu equivalente valor real, que é incomparavelmente superior a €5, há que fazer muitos cálculos.
Corrijo: "...erradas seguidas pelo Poder Central se traduziram em falta de..." para "...erradas seguidas pelo Poder Central, que se traduziram em falta de...".
ResponderEliminarEstas Minas foram pedaços da minha vida que é recordar
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