quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

AS MELHORES MEMÓRIAS DA MINHA INFANCIA !...


Venho pensado muito na minha infância, não com saudade ou saudosismo e nem com desejo que tudo tivesse sido diferente. Apenas tenho pensado. Pensado talvez para resgatar as lembranças da criança que fui, que pude ser, que me deixaram ser. Tenho- me esforçado para lembrar pequenos momentos que podem ter definido a personalidade, os traumas, a visão de mundo e até o jeito que hoje lido com a felicidade e com os momentos de frustração.

Alguns dias atrás, em conversa com amigos, abordávamos os lugares da nossa infância, fiquei com a ideia que a pó do tempo tinha acabado por apagar quase tudo. Inconformado, tomei a coragem de percorrer em pensamento, os lugares e caminhos por onde a minha infância se tinha passado, na esperança de me reavivar aquele tempo…

A essência dos lugares, lá estão. Tudo o resto é um outro mundo que já nada me diz, nada tem a ver comigo. Faltam as pessoas, aquelas pessoas, para que tudo aquilo faça algum sentido. A oportunidade da passagem pelos lugares incitava-me à memória. Mas a memória agora prega-nos partidas. Hoje a minha infância, apenas guardo recordações dispersas, divididas faltando-lhes o fluir dos dias. Tudo me parece já tão longínquo tão distante! As gavetas da memória, outrora tão arrumadas desapareceram com o tempo. Apenas sobraram pequenas impressões sem nexo, desencontradas umas das outras. Era este todo o meu mundo que me rodeava, moldado com palha, água e terra que decorriam as minhas brincadeiras, feitas de diabruras que pregávamos uns aos outros. 

RUA PADRE CRUZ

Eram os jogos de rua: da bilharda, à bucha-Nova, do arco, do cântaro, do bilro, do berlinde, à bola de trapos, às escondidas, o comer a sopa de cebola e batata, o “mata bicho” o roubar o açúcar do armário, o ver fazer os cigarros ao meu pai, o mês de maio, mês de Maria, as idas ao terço à noite da minha mãe, o ir à rebusca das espigas, da azeitona, o nascimento da minha irmã mais nova, o caldo de galinha, as batatas com bacalhau cozido ou à espanholada, alegria e o rebuliço do fazer os fritos e doces no Natal, a alegria da caixa mágica a preto e branco, na taberna do sr.. Carlos e da sra. Antónia xu xu, os dias de inverno na alfaiataria do meu pai à braseira a ver fazer as calças e fatos, a catequese e catequistas, brincar no adro da igreja ao pião, as trovoadas de Verão e eu cheio de medo, enquanto a minha mãe orava aquela oração a Santa Bárbara, ir a regar a horta com o meu tio Porfírio. Já procurei muitas palavras para qualificar um tio. Até hoje nenhum me soou mais apropriado do que “tesouro”. Este meu tio Porfírio, era um pouco pai, um pouco avó, um pouco irmão e um bom amigo. Ter um tio como este é a eterna tentativa de ser absolutamente tudo para alguém. Cuidava de mim como pai, mimava como avó. Era assim este meu tio. Também neste tempo começava a época das frutas, ia às maçãs, às cerejas, uvas e aos figos. Enfim…

Como de verão a água na aldeia era pouca, o tanque público era pequeno para tanta gente e a água era também pouca, as mulheres, não tendo onde lavar a roupa, às vezes, juntavam-se cinco ou seis vizinhas em direção às ribeiras. Eram tardes de verão maravilhosas passadas no fradal, no ribeiro dos inverniços e no rio maçãs.

De manhã, antes do romper da aurora, levantavam-se para fazer a merenda e ao nascer do sol, lá iam elas, com a sua roupa suja em cima dos burros, algumas acompanhadas dos seus filhos mais pequenos. Não lhes largávamos a roda das saias. Mas alguns mais ousados, organizávamos correrias para ver aquele que chegava lá primeiro. Só visto! 


IGREJA MATRIZ

Era uma autêntica alegria. E, no meio disto as nossas mães gritando: ó António, ó Ilídio, anda cá meu filho! Não corras tanto que o caminho é muito ao fundo e podes partir a cabeça e as pernas! Anda cá, ouviste? Ó alma danada! Onde ele já vai, olhem só, que correria! Este rapaz mete a minha alma no inferno. E a ladainha continuava, continuava… quanto mais falavam mais vontade tínhamos de andar. E, cansados arfando, chegávamos ao ribeiro. Deitávamos sobre as ervas verdes na margem, e nelas nos rebolávamos e revirávamos. Eram o nosso doce leito.

Estávamos no rio…. Era uma festa, de gritos e pulos. Só então, muito depois, ao fundo da curva de um carreiro é que elas apareciam de bacias à cabeça e mãos à cintura, caminhavam apressadas tagarelando umas com as outras, bem-dispostas para um dia árduo de trabalho à hora do calor. Como relatar este doce prazer de ver as nossas mães contentes, todas suadas pelo calor e pelo esforço de esfregar a roupa, conversando animadamente umas com as outras? E quando cantavam? Que vozes que elas tinham! Foram poucas ou quase nenhumas as canções que me ficaram na memória, mas, passados que são tantos anos ainda não encontrei paz de alma e deslumbramento semelhantes, como quando sentado todo nu em cima duma pedra lavada pelas águas de inverno, sentia ao escutá-las. Eram vozes finas melodiosas que cantavam coisas da terra, do trabalho dos seus homens, os seus amores, ciúmes, ódios… Como tudo isto era belo!

 Não havia prazer mais delicioso… Depois desta pausa ia a ter com os outros que andavam a brincar. Então era vê-los!... Correndo uns atrás dos outros, percorríamos a zona toda, descalços. E neste frenesim delirante, cansado e exausto, vinha-me sentar ao pé de minha mãe. Ela, ao ver-me assim tão suado e com a cara em brasa, dizia-me: 

ANTIGA ESCOLA HOJE POSTO DA G.N.R.


Ah! meu patife, amanhã é que vai ser lindo, depois eu é que tenho de te aturar, meu malandro. Aí se me apanhas uma pneumonia que te mato. Mas não ligava ao que ela dizia. Deixava-a falar, falar… E, muito meigamente, já mais calmo e menos suado, dizia-lhe: Tenho fome, mãe, dê-me pão! Não, daqui a nada vamos comer. Deixa-te estar aqui quietinho ao pé de mim, só falta acabar de lavar as calças do teu irmão.

E, assim, lavada toda a roupa, sentados na erva, à volta das toalhas estendidas no chão só se viam rostos a escorrer suor, rubros, queimados pelo sol comendo sofregamente, com prazer.  Mas, depois da barriga cheia, ó pernas para que te quero! Brincávamos com tudo quanto encontrássemos e nos viesse à cabeça. Mas, o nosso jogo preferido, era o jogo das escondidas, realmente cada qual procurava o sítio mais disparatado para se esconder. Os meus preferidos eram as rochas. Pequeno e arisco, de olhar trocista e malandro, corria que só visto, quase nunca davam por mim.

Cansado de tanto correr longe delas, deitava-me à água, mas, como não sabia nadar mergulhava as pernas e a cabeça refrescando-me, mas como estávamos longe das nossas mães tínhamos medo de que nos batessem. Mas não, elas não nos batiam! Já tinham lavado e enxugado a roupa, e tomaram banho aproveitando-se da nossa ausência. Uma vez enxutas, davam-nos o lanche, metiam tudo dentro das bacias e das cestas das merendas e assim iniciávamos a nossa viagem de regresso a casa. 

RIO MAÇÃS


Estava terminado mais um dia passado no rio. O sol já se começava a pôr. A nossa alegria ainda permanecia. Mas o que se sentia mais nesses momentos, era pena de o dia ter corrido tão depressa. E tristonhos por termos de subir aquela encosta tão íngreme, quando estávamos tão cansados e exaustos, era bem um autêntico calvário. As pobres das nossas mães coitadas, estafadas ainda tinham de nos arrastar: a uns pelas mãos, a outros dizendo-lhes que se agarrassem às saias, ora repousando aqui, ora descansando acolá, chegávamos finalmente a casa. Comíamos uma sopa de couves com um carolo de pão e depois, cama. Dormia como um anjo, dizia minha mãe.

Atualmente alguns jogos/brincadeiras da minha infância estão esquecidos e estagnados no tempo, pois a tecnologia acabou por interferir um pouco nesse esquecimento e claro as próprias pessoas também fazem por isso. Andamos tão focados no trabalho e na rotina, que só queremos algum descanso e acabamos por não ter paciência ou tempo para brincar com os mais pequenos. Nos dias de hoje, não sei se na escola ainda fazem algumas brincadeiras das que vou referir, tais como o jogo da macaca e o jogo das cruzes, enfim…

No verão vinham as festas, mais adolescente adorava saltar à corda, uma brincadeira tão simples que na minha visão achava divertido. Havia tantas brincadeiras e bem mais saudáveis que um ipad, telemóvel ou computador que realmente olhando para os tempos de agora, parece tudo muito superficial e fictício. Inventaram aplicações e jogos online para tudo, mas nada fará mudar o que em tempos eu valorizei imenso. 

RIBEIRO DA ESPADANA


O convívio com os amigos e brincadeiras divertidas em que o nosso tempo era ocupado com sorrisos, gargalhadas e muitas histórias por contar. Por meio do jogo, abarcava o mundo à minha volta, aprendia regras, legava habilidades físicas como: correr, pular, aprender a ganhar e a perder. O brincar também desenvolvia a aprendizagem da linguagem e a habilidade motora.

As brincadeiras adequavam-se à minha conceção, brincava por necessidade e era fundamental ao meu desenvolvimento com o uso da imaginação em ação. O brincar desempenhava um papel importante na socialização com os demais, permitindo-nos aprender a partilhar, cooperar, comunicar e a relacionar fazendo prosperar o respeito pelo outro bem a autoestima, tudo resumido aprender brincando.

Na interação, os adultos sempre tinham ensejo de nos ajudar na elaboração das inquietações que surgiam durante a brincadeira, bem como enriquecer e estimular a nossa imaginação, despertando-nos ideias e questionando-nos para descoberta de soluções. Usando apenas a imaginação, eu conseguia resolver os mais variados tipos de situações. Nunca tive brinquedos, eu inventava os meus próprios, com carrinhos de linhas, tábuas, arame e cordel. Bastava uma pedrinha para o mundo se transformar. É bom recordar e reviver o que em tempos já nos fez feliz :)

Ao longo destes anos, cada qual procurou uma vida melhor. Uns emigraram e outros estão espalhados por todo o País, mas essa amizade pura e desinteressada ainda se mantém, com aqueles que mantenho contacto. Como esse tempo me fascinou! Nem só de histórias lindas vivi a minha infância. Passei muito tempo da minha vida elevando e lamentando as faltas e chorando as ausências. 

O BURRO A PASTAR


Por isso, estou resgatando tudo de bom que tive para me abraçar e me perdoar hoje, ser feliz hoje, agradecer o hoje, e como crianças costumam fazer, viver o hoje.

Com o passar do tempo, percebi que a vida de cada um acabou tomando um rumo diferente. Rumo que o próprio destino se encarregou de traçar. O cotidiano foi e é sempre a luta pela sobrevivência. Trabalhar e se ocupar, preocupar-se com o futuro. Então aqueles amigos que fiz durante a infância, aos poucos foram se distanciando... E cada vez mais, até que nunca mais os vi com a mesma frequência de antigamente.

Hoje tudo é tão estranho. Nunca me imaginei adulto! Quer dizer, sempre imaginei, mas não achava que me tornaria tão rápido. Vejo que alguns daqueles velhos amigos e colegas são, pais de família. Aqueles que na época eu jurava que nunca teriam jeito por serem tão bagunceiros, hoje tem ótimos empregos e vivem bem. Aqueles que eram os mais tímidos e certinhos, que defendiam sempre o ponto de vista pessoal, hoje são pais de um ou mais filhos.

Posso ser triste ou celebrar ao contar a minha história. É uma tese de perspetiva. Sempre olhei para as dificuldades como uma oportunidade de conseguir ou tornar algo melhor. Descobri cedo demais o poder de usar a nossa imaginação para transformar realidades. Lembro até hoje que toda a vez que sentia fome ou medo, criava uma história na minha cabeça sobre como seria uma realidade diferente. Vivia sonhando com o que não tinha e pensando no que precisaria fazer para ter.


MENINOS DO BAIRRO DE BAIXO

Hoje, disto tudo o que resta destas memórias, para além de algumas vezes de barriga cheia, é claro e destas histórias para contar aos filhos e aos netos, se bem que estes últimos tenham tido dificuldades em acreditar, visto que nada lhes falta e não conhecem as consequências da palavra miséria, ou se calhar, nem a própria palavra fome…

A infância é o período no qual edificamos as bases que sustentarão tudo o que virá depois. É também um período mágico, onde o brincar e a imaginação constroem memórias afetivas cheias de significado que irão perdurar por toda a existência.

Engana-se quem pensa que o começo da vida é uma etapa que fica para trás depois que somos adultos. É um ciclo vivo, que volta e se renova. Ecos da criança que fomos continuam a repercutir dentro de nós no decorrer da vida...

Ilídio Bartolomeu

30-11-2019



sábado, 5 de dezembro de 2020

FALAR DO NATAL!...


 

O Natal é uma data em que comemoramos o nascimento de Jesus Cristo. Na antiguidade, o Natal era comemorado em várias datas diferentes, pois não se sabia com exatidão a data do nascimento de Jesus. Foi somente no século IV que o 25 de dezembro foi estabelecido como data oficial de comemoração.

Portugal é um país de tradições e costumes bem enraizados na cultura do país. A época natalícia não é exceção e há inúmeros rituais que se mantêm bem vivos ano após ano. Há tradições que se repetem de norte a sul do país, como o presépio, a árvore enfeitada e o pai Natal,

Nesta época as cozinhas enchem-se de aromas e sabores. Por Trás-os-Montes, onde as receitas têm como principais ingredientes o polvo, o bacalhau, couve e raba. As sobremesas são filhós, rabanadas e aletria.

Feita a ceia de consoada, o espírito não acaba por aqui. Numas casas ouvem-se músicas de Natal e desembrulham-se as prendas e noutras não há grandes tradições a seguir à risca.

Para falar do Natal, não existem segredos, basta olhar para dentro de nós mesmos. No Natal, estamos propícios a amar mais, ter mais carinhos, ser mais solidários. É o que nos envolve, este Espírito Natalino. Mas vejamos o mundo num foco mais nítido,  isso ocorre somente nesta época do ano. O nascimento de Jesus Cristo tem o poder de causar essa transformação em nós. Época em que surgem milhares de voluntários, pessoas fazendo os seus donativos, pessoas abraçando-se, trocando calor humano com os seus entes queridos. Eu vejo muita gente engrandecer diante desse espírito, mas eu somente tenho a perguntar: Por que?
Porque essas coisas só ocorrem no mês de Dezembro? Será um mês sagrado? Será que é tão difícil sermos assim o ano inteiro? Todos os dias de nossas vidas, nós devemos amar uns aos outros, respeitar uns aos outros, sermos solidários. O mundo não funciona somente no Natal, as crianças, os necessitados não carecem de carinho apenas no Natal, pessoas que necessitam, não passam fome, não sentem frio apenas no Natal. 

Em 2020, tudo começou  a ir mal, em março, adormecidos não previmos o vírus chegar. Dizimou muita gente, pessoas que tinham uma perspetiva de vida longa, planos, anseios, viagens, bares, cafés, restaurantes fechados e todas as atividades restringidas. “Estamos dentro de uma guerra. A palavra pode ser essa: guerra pela sobrevivência".

Os dias vão-se arrastando lentamente,  um isolamento total, aulas suspensas.  Os pais servindo de ponte  entre escola e aluno, porém,  chegou -se à conclusão de que os pais não estavam preparados para essa difícil missão,  muito stresse,  gritaria, ofensas aos professores.

Não sei como será,  mas o Natal à mais de 2000 anos que é celebrado e só sei que esta recordação ficará por muitos anos em como o ano que e o “Pai Natal faliu”.

Natal também é tempo de aprender. Aprender perdoar, aprender amar, aprender abraçar, aprender beijar, aprender ser humilde, aprender a entender o que realmente as pessoas querem.

Neste ano, a nossa árvore de Natal pode não ter presentes postos em baixo dela. Que neste Natal e em todos os dias do próximo ano, possamos fazer de Jesus nosso melhor amigo, pois Ele é o maior motivo do Natal e da nossa existência. Feliz Natal e um novo ano cheio de amor, paz, amizade, humildade e sabedoria.

Natal, pode ser todos os dias, basta querer abraçar! Eu quero olhar o Mundo e poder ver isso todos os dias.

BOAS FESTAS

Ilídio Bartolomeu

domingo, 8 de novembro de 2020

DIA DE SÃO MARTINHO…


 

Dia de São Martinho, manda a tradição que se comam castanhas e que se prove o vinho novo…

 Diz a lenda que Martinho, nascido na Hungria em 316, era um soldado. Era filho de um soldado romano. O seu nome foi-lhe dado em homenagem a Marte, o Deus da Guerra e protetor dos soldados. Aos 15 anos vai para Pavia (Itália). Em França abraçou a vida sacerdotal, sendo famoso pregador. Foi bispo de Tous.

Certo dia de novembro, muito frio e chuvoso, estando em França ao serviço do Imperador, ia Martinho no seu cavalo a caminho da cidade de Amiens quando, de repente, começou uma terrível tempestade. A certa altura surgiu à beira da estrada um pobre homem a pedir esmola.

Como nada tivesse, Martinho, sem hesitar, pegou na espada e cortou a sua capa de soldado ao meio, dando uma das metades ao pobre para que este se protegesse do frio. Nessa altura a chuva parou e o Sol começou a brilhar, ficando, inexplicavelmente, um tempo quase de Verão.

Daí que esperemos, todos os anos, o Verão de S. Martinho. E a verdade é que S. Martinho raramente nos dececiona. Em sua homenagem, comemoramos o dia 11 novembro com as primeiras castanhas do ano, acompanhadas de vinho novo. É o Magusto, que faz parte das tradições do nosso país.

Mais tarde terá tido uma visão de Jesus e decidiu dedicar-se à religião cristã. Faleceu a 8 de novembro de 397 em Tours.

O Magusto é uma festa popular, as formas de celebração divergem um pouco consoante as tradições regionais. Grupos de amigos e famílias juntam-se à volta de uma fogueira onde se assam as castanhas para comer, bebe-se a jeropiga, água-pé ou vinho novo, fazem-se brincadeiras, as pessoas enfarruscam-se com as cinzas, cantam-se cantigas. O magusto realiza-se em datas festivas: no dia de Todos-os-Santos ou no dia São Martinho. Inúmeras celebrações ocorrem não só em Portugal inteiro, mas também na Galiza e nas Astúrias.

Leite de Vasconcelos considerava o magusto como o vestígio dum antigo sacrifício em honra dos mortos e refere que em Barqueiros era tradição preparar, à meia-noite, uma mesa com castanhas para os mortos da família irem comer; ninguém mais tocava nas castanhas porque se dizia que estavam “babada dos defuntos”.

Em Argoselo, é comum fazer o Magusto nos estabelecimentos de ensino, em cafés e restaurantes, em casa com a família e amigos

 

PROVÉRBIOS POPULARES (S. MARTINHO)

- No dia de S. Martinho vai à adega e prova o teu vinho.
- Mais vale um castanheiro do que um saco com dinheiro.
- Dia de S. Martinho, fura o teu pipinho.

- Dia de S. Martinho, lume, castanhas e vinho.

- Pelo S. Martinho, prova o teu vinho, ao cabo de um ano já não te faz dano…

- Água-pé, jeropiga, castanhas e vinho, faz-se uma boa festa pelo S. Martinho

 

Ilídio Bartolomeu

domingo, 18 de outubro de 2020

NO TEMPO DE ESCOLA ERA ASSIM!...

Cresci numa terrinha chamada Vimioso. com chuva, muita chuva e frio os meus pais obrigavam me a ir escola. E a pé!!...mas ...adorava ir a pé com os amigos e depois de volta a casa…Eu não tive direito ao escalão, nem livros grátis, mas muito menos cheque dentista! Não tinha google, nem telemóvel!

As pesquisas para os trabalhos da escola eram feitos na biblioteca da escola, nas enciclopédias e recortes de jornais, eram escritas à mão, com palavras nossas ( se fosse cópia do livro ou tivesse erros, estávamos lixados) Tínhamos sempre TPC's (todos os dias de quase todas as disciplinas).
Na escola havia o gordo, a magricela, anão, o nariz de porco, o caganeira e por aí vai... o narigudo, o preto e o branco... o índio…

Toda a gente era gozado, às vezes até discutíamos, mas logo estava tudo resolvido e seguia a amizade... era brincadeira e ninguém se queixava de Bullying....Muitos até hoje ainda permanecem com os apelidos! Existia o valentão, mas também existia quem defendesse…

Havia o dia do flúor, o dia de combater os piolhos, dia da vacina, da foto do ano letivo, da feira de ciências e período de olimpíadas!

Havia o vendedor à porta da escola onde compravamos, as Gorila, aquelas chiclas que traziam as tatuagens e fazíamos bolas enormes e os bolicaus que traziam os tazzos .
A frase "já vou" era para ficar mais tempo na rua a brincar e não enfiado num tablet ou num computador...
Colecionávamos figurinhas, papel de carta perfumados, bonequinhas de papel, poster's da revista bravo, berlindes, piões, tazzos, etc. As brincadeiras eram saudáveis, de bater em figurinhas e não nos colegas e professores.
Música era só no rádio, na hora dos discos pedidos, ficávamos a rezar para que o locutor não falasse nem entrasse publicidade para que fosse possível gravar na K7!! Inventava-se teatrinhos, brincávamos aos médicos, às escondidinhas, à apanhada, jogávamos à bola, ao elástico, ao jogo da verdade ou consequência, ao bate pé, ao espeto, á corda, e à macaca…

Andávamos de bicicleta, carrinhos de rolamentos etc..etc...
Não importava se meu amigo era negro, branco, pardo, rico, pobre, menino, menina, brincávamos todos juntos, "bulhas" era só "mano a mano" os amigos de um só se metiam se do outro lado houvesse um chico esperto a provocar e a meter-se no meio.

Na televisão assistíamos à Heidi, Tom Sawyer, Sítio do Picapau amarelo, Tom e Jerry, Rua Sésamo, Ao Bocas, Scooby Doo, jogos sem fronteiras....entre muitos outros...
Que saudades dessa época em que a chuva tinha cheiro de terra molhada! Em que o Bom Dia, o Obrigada, o Com Licença o Por Favor, o Senhor(a), ainda se usava diariamente! Em que o Não era sempre não e aí de nós que tentássemos interromper as conversas dos mais velhos...uiiiii!!!
Época em que nossa única dor era quando chegávamos a casa todos arranhados e com pisaduras. Éramos felizes em comparação com esse mundo de hoje onde tudo se torna bullying e/ou preconceito, onde se esquecem as boas maneiras e a educação.

 Desde a primária íamos sozinhos para a escola...

Os pais eram donos e senhores dos filhos e a colher de pau ficava sempre em cima da mesa, bastava os pais olharem.... Só nos era permitido levantar da mesa quando terminávamos de comer e só depois dos pais darem autorização.
Quando foi que tudo mudou e os valores se perderam e se inverteram desta forma?

Valores (muitos não todos) que temos que retomar!!

Bons tempos que não voltam

PS: Se és deste tempo copia e cola no teu mural....

Texto de:

Rita Vara

 

sábado, 17 de outubro de 2020

NEM TUDO É POLITICA! MAS A POLÍTICA ESTÁ EM TUDO!

Ainda que se torça o nariz para a política, convém lembrar que em tudo há política. Nem tudo é política, mas a política está em tudo. Por exemplo: um casal em lua de mel não é necessariamente uma questão política. Mas a qualidade do hotel onde se hospedam tem a ver com política. As pessoas, podem não ter a menor ideia de que a qualidade do café da manhã que tomam tem a ver com política. O que é certo é que tem mesmo.

A política é uma faca de “dois gumes”, como se diz em alguns lugares. Serve para oprimir ou libertar. É como a religião, que também serve para oprimir ou libertar. Foi um erro de certa tradição marxista achar que toda religião é alienação, até que, de repente, se descobriu que religião também é fator de libertação.

Podemos não saber que a política está em tudo, mas está. Porque o ser humano não inventou, acredito que nem inventará, outra maneira de organizar a sua convivência social a não ser através da política. A pandemia que estamos enfrentando é, antes de tudo, um problema político. E para compreendermos adequadamente este momento histórico, devemos começar por aquilo que, de tão evidente que é, por vezes se torna ignorado. Por isso lembro a relevância da utilização de máscara, manter o afastamento social, e a lavagem frequente das mãos gestos simples, que ajudam direta e indiretamente a atenuar o esforço sobre humano, a que os nossos profissionais de saúde estão submetidos.

 Hoje em dia, muitas pessoas, sobretudo jovens, têm nojo de política, porque acompanham noticiários que falam de corrupção, roubalheira, descaramento, favoritismo, etc. Lembro a eles: quem tem nojo de política é governado por quem não tem. E tudo que os maus políticos querem é que tenhamos bastante nojo, para eles ficarem à vontade a raspar o tacho!

Portanto, não existe neutralidade política. Existe a falsa ideia de neutralidade. Mas, de alguma maneira, cada pessoa interfere na política da sua Terra, para o bem ou para o mal. Afinal, nenhuns políticos que ocupam os lugares públicos, não é por que eles querem. Todos são eleitos através do voto dos eleitores. Então, a questão também é analisarmos por que nós os eleitores votamos mal. Mais uma vez por causa da política. Porque vivemos num mundo onde a política verdadeiramente é controlada por uma minoria.

Lembrem-se disso! Quando você ou os seus amigos disserem: não quero saber de política, não vou mais votar, vou anular o voto, estão a fazer o jogo dos maus políticos.

Quem nunca ouviu na escola a frase: “o homem é um animal político”? Pois bem, quando Aristóteles pronunciou essa frase, ele quis dizer que todo homem precisa um do outro, que é da natureza humana viver em sociedade e que através da busca pelo bem comum, é que se tem a constituição da pólis, ou seja, a cidade, e todos os lugares onde é partilhada a vida pública.

Bom, apesar da existência de corrupção e de manipulação de ações para atender interesses específicos no ato político, temos que entender que esse quadro negativo só poderá mudar através da própria política. Isso porque a política é o instrumento de ação de transformação da sociedade.

Ora vejam, quando uns administradores populistas de um Facebook de todos bem conhecido, parece querer monopolizar alguma nostalgia do passado ao  retirar algumas publicações incomodas, isso é o quê? Claro que é política! Porque se as retiram, é algo que não vai ao encontro das suas ideologias.

Quando alguém fala em problemas como:

Faltam lâmpadas na via publica, a água das torneiras sai turva, rebentou um cano da água, o lixo está amontoado nos contentores ou a estrada tem falta de paralelos, etc. Logo a censura vem dizer que ali não há lugar à política, este é um espaço para lembrar o passado e esperar pacientemente que o futuro nos deixe mais distantes da realidade dos nossos vizinhos. Este é o estado da mentalidade destas pessoas!

O que é feito do espirito de Argoselo? Foi para isto que nascemos? Para ver este espetáculo de pó de arroz que esconde as misérias de dia e espera que a noite mantenha o que realmente importa na escuridão?

Não precisamos esquecer o passado completamente, basta que o consideremos para tirar boas lições e continuar caminhando vivendo o hoje e, com o foco no futuro que desejamos construir. Temos responsabilidade de olhar para a frente e deixar aos nossos filhos um Argoselo melhor (se tal não for possível pelo menos igual).

Não podemos aceitar viver num presente a falar dum passado que é melhor do que o futuro.  O passado, assim como o presente, é parte da nossa história. Cada experiência vivida transforma-nos de alguma maneira, e todas são fragmentos de quem somos hoje. Entretanto, é importante ter cautela para que as memórias não se tornem impedimentos para viver plenamente o seu momento presente na essência.

Tenho lido, com muita atenção os textos de três ou quatro  pessoas em dois dos facebook, e foram eles que me fizeram reportar a um período em que (afinal) ainda acredito em Argoselo. Não é que tenha desistido a acreditar, mas que sou obrigado – pela história da nossa Terra a acreditar.

Confesso-lhes que é com alguma tristeza que tenho vivido há anos a esta parte em análise da politica que influencia os destinos de Argoselo.

 “Em Argozelo há alguns políticos que nem conversar sabem e pensam que sabem de política.” não é uma citação minha, mas eu não diria melhor. Lembro-lhes, se me permitem, que eu também faço o exercício de exorcismo que os meus amigos/as fazem muito bem – escrever para não esquecer.

Sinceramente tantos grupos de Facebook em Argoselo, só para carregar likes uns para os outros, desculpem meus amigos, não faz sentido algum e não é benéfico, só servem para dividir e não para unir. A não ser essas três ou quatro pessoas que de vez enquanto escrevem uns textos relacionados com Argoselo, não descortino algo mais senão likes e mais likes. Mas gostam de quê? Opinem pelo menos para se saber se é sincero esse like.  De todos os seis grupos que existem de facebook, só um faria verdadeiramente sentido, onde todos poderiam expor tudo e mais alguma coisa e discutindo Argoselo.

(Amigos de Argoselo) haverá um nome mais consensual?  Somente uma opinião… vão dizer-me: lá está ele a fazer política. É política sim… todas as opiniões são políticas, basta não estar de acordo. Mas o bem  comum está acima de tudo!

Por exemplo: que é feito das forças políticas da Concelhia e órgãos Locais, quando querem discutir com as habitantes  um plano para o Concelho, desaparecem de combate. Pois a bazuca que aí vem da EU, poderiam dar aso a uma candidatura de projetos para o desenvolvimento das localidades tanto precisam. Com certeza estão  invernados, é o que têm feito há longos anos? Só falam na última quando já não há possibilidades de nada. Acordem... também é politica! E sem ela não há nada!

Está tudo doido! Há alguma política pelo facto de alguém  expor uma opinião e o outro dizer que neste sitio não há lugar para política, isto é areia para os nossos olhos. Isto não é Argoselo! Não é Concelho! Não é nada!...

Portanto não se escandalizem… falem o que coração sente! imparcial é quem já se decidiu pelo mais forte.

Tenham um bom dia.

Ilídio Bartolomeu

 

terça-feira, 13 de outubro de 2020

Nº2 ARGOSELO MEMÓRIAS DE SEMPRE


Não podia deixar de aqui partilhar este belo filme, o qual retrata algumas das artes e ofícios que se vão perdendo na voragem do tempo. Imagens do ferreiro, do funileiro do alfaiate, do sapateiro e de muitos outros, intercalando com retratos e pequenos apontamentos da vivência do nosso mundo rural. É todo um modo de vida que dentro de alguns anos, não muitos, fará parte somente das nossas memórias, pois os seus acores já terão desaparecido e os cenários, as nossas aldeias e o nosso campo, denotarão ainda mais abandono e desolação.

Filmado em Argoselo,  podia-o ter sido em muitos outros locais do nosso país, nomeadamente no seu interior mais esquecido e desvalorizado por quem de direito.

domingo, 11 de outubro de 2020

JÁ FEZ UM ELOGIO VERDADEIRO HOJE?...

Falar de pessoas tão especiais é motivo de muita alegria, porque são pessoas que realmente se preocupam com o bem-estar alheio. São duros quando necessário. Às vezes falam-nos coisas desagradáveis, ou melhor, que pensamos ser desagradáveis, porém eles têm uma única intenção, ajudar-nos. Eu já passei por algo semelhante!

O bem comum é fruto da generosidade dessas pessoas que gostam de trabalhar em conjunto. Elas preferem doar algo que poderia ser só seu.

Os verdadeiros amigos estão presentes em todos os momentos, concorda? E quando falamos de todos os momentos, incluímos tanto os bons quanto os não tão bons. Realmente existe muita gente que só quer saber das horas boas, das comemorações e na primeira dificuldade afasta-se.

É a aqui que está a grande diferença dos verdadeiros para os falsos amigos. O verdadeiro amigo é aquele que realmente fica feliz com a sua contribuição. E você sabe distinguir quando alguém fica verdadeiramente contente com a sua vitória ou está ali apenas para se aproveitar do momento, ou bem lá no fundo está com inveja.  Conhece alguém assim?

Há  gente que se diz teu amigo, mas incentiva-te a fazer coisas que vão prejudicar-te. Dizem-se amigos e só estão preocupados com eles mesmo. Eles aproveitam-se de situações para se favorecer, mas não estão preocupados seja com quem for. Só estão por perto, pensando no próprio bem.

Amigo de verdade está por perto sempre. Independente da distância, cidade ou país onde mora, ele está por perto e sabe que se pode contar com ele. Valorize os seus verdadeiros amigos e tenha um novo olhar para as suas amizades!

Outro ponto que não posso de deixar de falar: as criticas fazem parte das nossas vidas. Devem receber uma atenção especial para serem “disparadas” com serenidade e brandura, para que sejam utilizadas de maneira construtiva. Sempre tenho dito que as criticas são importantes, mas mais importante que as agulhas, é o “frasco de mel” que deve ter consigo para “molhar” a ponta da agulha, antes de a espetar…

Por acaso, já leu alguns dos artigos históricos de LUIZ RODRIGUES, sobre Argoselo no Facebook? Se não leu, vale apena lê-los. Se não os leu, ainda os poderá encontrar no Facebook, se não conseguir, pode encontra-los no (blog Freixagosa em Categorias, (Argoselo e sua História) o ultimo que publicou, foi no dia, 10 deste mês no Facebook (Todos Juntos Somos mais) não perca e…

Faça um elogio sincero pelo menos uma vez no seu dia e mostre para as pessoas que, apesar de toda ambição do mundo, ainda há quem vislumbre, reconheça e admire as virtudes alheias.

Portanto, elogiar é uma atitude que não deve ser extinta. A prática de elogiar as pessoas pode aumentar os comportamentos que nos agradam, sendo que gratificar uma pessoa dessa forma um comportamento favorável é considerado muito mais efetivo comparado ao ato de ignorar ou punir o comportamento que não nos agrada...

Pensem nisso! Elogiar faz bem para a alma e para o coração…tanto de quem faz, como de quem recebe…

Tenham um bom dia

Ilídio Bartolomeu

 

UMA HISTÓRIA DE CONFLITOS DE MEMÓRIAS

Do Alto de S. Roque, ao vale mais profundo do Teixo, do xisto das entranhas, donde saiu o estanho e volfrâmio, ao granito esculpido das campas milenares, da água calma, presa nos Inverniços, ao som das cascatas que fluem livres em Cal Silvar, do denso carvalhal da Estercada à rara crista do Serro surge o trabalho ousado da engenharia popular, simples engenhos para dar resposta a problemas quotidianos e a grandes obras que moldam a paisagem.

Chega até nós uma enorme riqueza cultural que manteve um estilo de vida em comunhão com a Natureza, séculos de História onde imperou um modelo económico centrado na casa.
A casa está concebida, não apenas como o lugar onde se mora. Engloba nela, para além da vivenda, espaços complementares de trabalho: curral, lojas, adega, espaço para o carro, para a lenha, procurando a intimidade, criando um mundo interior para que o exterior seja visto apenas pelas janelas. O elemento de ligação com o exterior é o portão, o único acesso para pessoas e animais e a sua estrutura coberta de madeira dá abrigo ao carro e serve de armazém do arado e outras ferramentas permitindo a realização de muitas tarefas ao abrigo do sol e chuva.

É a altura do carro que transporta os produtos do campo, com os estadulhos, que determina a medida para a portada. Define ainda a localização do armazém de sementes e palha, mantidos em lugar elevado como é o caso do palheiro. Por vezes, alinhado com o portão, na parte superior, fica a porta de abastecimento do palheiro.
Os diferentes tipos de casas admitem múltiplas variantes, o recurso a paredes meeiras, por exemplo, é uma estratégia tendo em vista a economia de espaço e recursos, muito utilizado em espaços mais urbanizados, cujas fachadas se enfeitam com varandas no piso superior e janelas no piso inferior.
Em Argozelo ainda é possível encontrar habitações que correspondem à típica casa transmontana, mas há sobretudo muitos exemplares que trazem até aos nossos dias o testemunho das vivências dos nossos antepassados – casas que resistem ao abandono, que nos gritam memórias de gentes que habitaram nelas e que receiam cair no esquecimento.

Escrito por

Luiz Rodrigues




sexta-feira, 9 de outubro de 2020

DÁ QUE PENSAR!

 

FARMACIAS REAIS

Farmácia Ferreira - Argozelo

Em Argozelo, a melancolia espreita a cada esquina. Entre casas abandonadas e becos que deixam adivinhar prados verdes até se perder de vista, a cruz da Farmácia Ferreira brilha timidamente. Uma utente nos seus 90 anos atravessa a custo a porta do costume, com auxílio da bengala. No saquinho preto gasto traz uns grelos do seu campo para oferecer à farmacêutica Julieta.

«Eu não lhes peço nada», comenta sorridente a directora-técnica de 62 anos, «quando têm umas verduras a mais vêm cá trazer-me». É assim que os utentes lhe agradecem o serviço prestado ao longo destes 32 anos, que vai muito para além da dispensa de medicamentos. A população, maioritariamente pobre e envelhecida, não tem mais ninguém a quem recorrer.

Mas nem sempre foi assim

Luís Cabral conta que, quando o multibanco não funciona, as pessoas têm de ir a Bragança levantar dinheiro

O utente Luís Cabral, de 71 anos, guarda com saudade as memórias de outra época. Quando chegou a Argozelo, com uns ternos 18 anos, trazia na mala o sonho de mudar de vida. O ano era 1966 e, como tantos outros jovens, Luís deixava o conforto da sua terra natal, em Viseu, para se juntar aos cerca de 160 trabalhadores das minas de volfrâmio.

Os tempos eram outros. Na pequena aldeia da freguesia de Vimioso, em Bragança, contavam-se mais de 2.000 habitantes e a economia estava em expansão. Pelas ruas havia pequenos negócios e grandes casas de famílias que ali se instalavam para trabalhar na agricultura, no curtume, na produção de amêndoa ou de cortiça e nas minas.

Porém, em 1985, a exploração de minério terminou. Os trabalhadores foram todos despedidos, à excepção de uma pequena equipa de manutenção que lá haveria de trabalhar até 1992, altura do fecho definitivo. Desempregados e sem perspetivas de futuro, muitos emigraram e, gradualmente, a aldeia foi perdendo vida.

A farmácia abriu em 1987, num antigo posto de venda de medicamentos. Na altura, apesar de as consequências do encerramento da mina já se notarem, ainda se via jovens. As escolas estavam abertas, havia algum comércio local e o centro de saúde tinha dois médicos, com consultas quatro vezes por semana.

Luís constituiu família e por ali ficou. Em tempos, chegou a trabalhar na agricultura. Agora «as pernas e os braços já não querem trabalho». Mas não é disso que se queixa. «Tínhamos o banco, tiraram-nos. Em 2001, a aldeia passou a vila e ainda ficou pior. Queriam fazer isto, queriam fazer aquilo. E em vez de fazer, tiram-nos o que havia». O multibanco lá ficou, embora chegue a estar aos quatro e cinco dias sem dinheiro.

Com o passar dos anos, a população envelhece e o despovoamento aumenta. Mas Julieta Ferreira não se arrepende do dia em que decidiu abrir a farmácia em Argozelo.

​«Acho que somos mais úteis aqui do que na cidade», afirma a farmacêutica​

«Acho que somos mais úteis aqui do que na cidade», explica. «Faz-me sentir bem saber que ajudo no que posso», desabafa, «e os utentes agradecem-me, voltando cá.» E mesmo quando vão às urgências à cidade, é ali que levantam os medicamentos.

A viver no andar por cima da farmácia, são muitas as vezes em que a farmacêutica atende os utentes de madrugada. «Um dia destes foi preciso um medicamento às quatro da manhã e a doutora abriu-nos a porta». O antigo carteiro da vila, Domingos Afonso, vive ali com a esposa e a única filha que ainda não emigrou. «O que temos de melhor é isto», chuta. «Os correios, para bem dizer, já nos tiraram. Se nos tiram a farmácia mais vale irmos para outro lado».

Aos 70 anos, Domingos não tem grandes dúvidas: «O que mais precisamos é de saúde». Porém, para os cerca de 700 habitantes de Argozelo, o acesso à saúde é quase um luxo. O médico de família está de baixa há um mês, por isso qualquer questão que não possa ser resolvida na farmácia exige uma viagem de 15 quilómetros até Vimioso ou do dobro da distância até Bragança. Com apenas dois autocarros por dia e sem veículo próprio, os idosos gastam entre 30 e 40 euros em táxi de cada vez que precisam de se deslocar.

«Temos de juntar forças para que a farmácia não feche», pede Manuel Oliveira

«É mau os poderes centrais não se interessarem mais por estas zonas, principalmente ao nível do centro de saúde e da farmácia, que têm de estar perto da população». O utente Manuel Oliveira fala sem rodeios. E conta que, mesmo antes do médico adoecer, o centro de saúde funcionava apenas um dia por semana. Devido à falta de resposta, o carpinteiro de 50 anos garante que há quem tenha de recorrer a serviços de enfermagem privada para conseguir ser tratado. «Por exemplo, para os meus pais, com 80 anos, se a farmácia fechasse era complicado», argumenta. E remata: «Temos de juntar forças para que isso não aconteça».

Sem médico de família e com os doentes crónicos a precisar da medicação, Julieta Ferreira faz o que pode para zelar pela saúde das pessoas. «Às vezes, empresto o medicamento e fico à espera da receita. Se tivessem de o pagar por completo, com certeza iriam interromper o tratamento, porque não teriam dinheiro suficiente». Mas a boa vontade nem sempre basta: «Há muitos medicamentos que faltam. Alguns temos de pedir ao laboratório e nem assim há garantias».

Aos 62 anos, a diretora-técnica não pensa muito acerca do futuro. Só sabe que baixar os braços não é opção: «O pior é a falta de medicamentos, o resto vamos controlando». Habituada a gerir a farmácia sozinha, acolheu alguns farmacêuticos em estágio, mas todos optaram por se mudar para a cidade. «Não é fácil fixar as pessoas», lamenta, «a minha filha é farmacêutica e também não quis vir para aqui».

Numa vila em que nascem um ou dois bebés por ano, as dificuldades aumentam dia após dia. Com o banco fechado, os correios a funcionar a meio-tempo e o médico de família ausente, a farmácia é um ponto de apoio para tudo. «Diariamente tenho pessoas a pedir-me para escrever cartas aos familiares, ler a correspondência e as faturas», conta. Como o marido da farmacêutica trabalha em Vimioso, alguns utentes aproveitam a boleia e há até os que pedem para lhes tratar de recados.

«A gente aqui está triste. Muito, muito triste». Leonor Fernandes, de 67 anos, chegou a Argozelo aos 20 e por ali construiu a sua vida. Depois de ter perdido o marido, há dois anos, tomou conta do café que era dos dois. E é atrás do balcão que observa com pesar o isolamento da sua terra, nas ruas em que, a cada dia, passa menos gente.

A farmácia, assegura, é o bem mais precioso dos argozelenses. É lá que Leonor compra os medicamentos, mede a tensão e o colesterol. À hora que precisa, a porta abre-se e os problemas são resolvidos com todo o cuidado. Seja às duas da tarde ou à uma da manhã. «Nós não temos mais nada sem ser a farmácia. Fecha tanta coisa, sabe? Até já nos tiraram o banco. Se nos tiram a farmácia, tiram-nos tudo».

Recopiado de publicação feita por:

Adosinda Tua Rua

25 de Março 2019


Excelente  Crónica

 

 Comentário

MANTER A ESPERANÇA MESMO NAS DIFICULDADES

Apesar de tudo, mantenho a esperança de que alguma coisa mude para contestar o abandono a que têm condenado a Vila de Argoselo, Ter esperança é ter a coragem de criar expectativas positivas. É pensar que sempre haverá uma saída, é saber que não há mal que dure para sempre. Quem tem esperança, sabe que a qualquer momento coisas boas podem acontecer. É o impossível se tornar possível, porque somente no coração em que há esperança acontecem milagres.

Manter a esperança viva é a maior prova de força que uma pessoa pode dar a si mesmo.

Ilídio Bartolomeu


quinta-feira, 8 de outubro de 2020

A FALTA DE GOSTO PELA LEITURA…

O hábito da leitura é de grande importância para a vida profissional e social dos jovens, uma vez que a leitura é essencial para um processo de aprendizagem satisfatório, pois é por meio da leitura que se abrem novos horizontes e torna-se possível entender e aprofundar conhecimentos sobre o mundo, até atuar nele efetivando o seu papel como cidadão.

A compreensão do que se lê depende de uma série de fatores, desde o nível de conhecimentos do leitor sobre a língua em que o texto está escrito, passando pelo tipo ou género de texto, pelo vocabulário e pela escrita, pelo tamanho e tipo de letra, até ao ambiente em que o leitor se encontra e à motivação que este sente pela tarefa de leitura.

A motivação prende-se, basicamente, com a vontade e o interesse. Portanto, é algo que pode ser suscitado por outrem. Assim, não significa o mesmo que gosto. O prazer sentido na leitura, constitui um estado ou sentimento de satisfação intrínseco, que não pode ser facilmente induzido em alguém. No entanto, as crianças e adolescentes podem desenvolver gosto pela leitura se forem continuamente motivadas para tomar contacto com os livros.

Pensar que existem um milhão de outras atividades que lhes dão mais prazer do que ler um texto, o grande leque de coisas para fazer nos dias de hoje é o principal competidor na corrida do desinteresse pela leitura.  Tantas as opções para ocupar o tempo e por isso, o ato de ler não é realizado por muitas pessoas. Evitando perder a oportunidade de tornar o ato de ler é algo natural e desmistificado, os professores contam como é que se faz nas salas de aula para incentivar a prática aos alunos. “Nas aulas, quando são de literatura, eles fogem da ideia do clássico. Procuram não adotar os textos em si, mas numa versão adaptada para que o interesse do aluno tenha em conta.

Vivemos numa sociedade cada vez mais complexa, com inovações sociais precipitadas e imprevisíveis alterações. Além disso, o uso veemente das novas tecnologias e a sede por informações imprime nas pessoas a precisão de adaptabilidade, opinião crítica, criatividade, competência para a inovação e abertura.

A leitura ponderada representa uma das boas vias para entender a realidade. É verídico que na nossa sociedade as práticas leitoras são pouco incentivadas e desenvolvidas. Desta forma, dado a sua importância, a leitura deve ser estimulada e integrada ao cotidiano dos estudantes e, consequentemente de jovens e adultos.

São muitas as pessoas que descobriram o prazer de ler graças às sucessivas recomendações por parte de amigos, que souberam motivá-las através de incentivos vários, suscitando nelas curiosidade e desejo de descobrir os mundos que os livros encerram.

Quanto mais aflitos os jovens se mostrarem perante a falta de vontade de ler, pior. Em vez de ficar preocupado ou irritado com o facto de se recusar a gastar um pouco do seu tempo a ler um texto, faça um esforço para se manter calmo e demonstre vontade em saber ao que se refere o mesmo. A criação de um bom ambiente passa pela aplicação das estratégias, inclui zelar para que haja serenidade, de maneira a que tenha condições para se concentrar na leitura.

Se até nós, adultos, preferimos ver um filme do que a ler o livro, pode ser difícil tentar explicar a uma criança porque deve ler… Ponha-se no lugar do seu filho e procure identificar-se com os seus sentimentos. Se o fizer, decerto terá mais vontade de o ajudar a concentrar-se e a despertar nele a vontade de saber o que o livro lhe poderá oferecer.

Contudo, tal atividade não pode ficar restrita apenas na escola, tendo de ser incentivada também em casa. O ambiente doméstico é o mais propício para combater á falta de incentivo á leitura, contando com o apoio e incentivo dos pais e responsáveis.

Estes, por sina, são os maiores colaboradores pela criação do hábito de ler. Entretanto, por maior que seja o incentivo, apenas ele não é o suficiente. É preciso que as crianças tenham curiosidade pelo assunto que está lendo. É de grande importância que as primeiras leituras sejam leves e que proporcionem lazer e satisfação ao leitor, consolidando assim, de forma mais fácil, o hábito da leitura.

Finalmente, talvez seja bom sublinhar que também nós, adultos, sentimos por vezes pouca vontade para fazer leituras extensas e resistência perante a ideia de ler por obrigação. Os textos são objetos densos, exigentes e pouco atraentes, sobretudo numa era em que o audiovisual impera, atraindo-nos a todo o momento.

Com base nos resultados pode-se demonstrar que o interesse pela leitura está precária. Mas não podemos deixar de salientar que ainda existem jovens e adultos que costumam procurar os livros não apenas como obrigação, mas como um meio de lazer. Assim sugere-se mais incentivo às pessoas desde cedo para obterem o hábito da leitura.

A leitura de um bom texto é um diálogo incessante: o texto fala e a alma responde.

Tenham um bom dia. Boa leitura.

Ilídio Bartolomeu